Parar a produção e distribuição dos canudos plásticos é essencial para reduzir a quantidade de resíduos, uma vez que o processo de reciclagem não acontece.

canudos plásticos
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Os canudos plásticos viraram foco de uma grande discussão sustentável no Brasil e no mundo em 2018 e seguem em pauta neste ano. As constantes imagens de resgate de animais marinhos afetados pelos plásticos incendiaram uma série de ações a favor do banimento dos canudinhos – e outros produtos considerados de uso único – em estabelecimentos comerciais.

No Dia Mundial do Meio Ambiente no ano passado, a Organização das Nações Unidas (ONU) lançou a campanha “Acabe com a Poluição Plástica”. Segundo relatório divulgado pela entidade, cerca de 8 a 13 milhões de toneladas de plástico entram nos oceanos, que ameaçam a qualidade de vida humana, da água e dos ecossistemas naturais marinhos. O estudo ainda diz que 50% dos produtos feitos com o material são consumidos apenas uma única vez.

O canudo plástico é visto como símbolo de toda esta discussão, acusado como maior exemplo de desperdício e impacto ambiental. Em diversos lugares ao redor do mundo, inclusive em cidades brasileiras, estão surgindo leis que colocam o produto como vilão da história. Diversas empresas globais também estão anunciando medidas para eliminá-lo de seus produtos em um curto espaço de tempo.

Não há dúvidas do efeito nocivo do plástico ao meio ambiente, assim como qualquer outro que chega ao final da sua vida útil e não recebe a destinação correta. Porém, é preciso ver os dois lados da moeda. O banimento é a melhor solução? Qual é o papel da indústria do plástico nesta história?

O debate é complexo e apresenta argumentos plausíveis de ambos os lados. Para incentivar o diálogo construtivo, o Going Green Brasil trouxe duas matérias especiais sobre o assunto, apresentando os dois lados da moeda.

Veja também: Banir os canudos plásticos é a solução? A opinião de quem é contra a medida

A favor do banimento dos canudinhos

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De acordo com Anna Carolina Lobo, coordenadora do Programa Mata Atlântica e Marinho do WWF-Brasil, o plástico é sim o maior responsável pela poluição nos oceanos, principalmente o microplástico. Como o próprio nome se refere, são pequenas partículas – de 1 a 5 milímetros – presentes na produção de diversos produtos para além das sacolas e canudos plásticos.

“O microplástico é encontrado em calças jeans, cosméticos, pastas de dente e até em bitucas de cigarros. Algumas matérias veiculadas recentemente colocaram as bitucas de cigarros como o principal vilão do momento, mas, na verdade, após o item ser dissolvido nos mares apenas o que resta dele é o microplástico”, explica Lobo.

Exemplos internacionais são constantes. No último mês de outubro, a União Europeia anunciou que até 2021 vai banir os produtos plásticos considerados de uso único em todo o seu território. Já a Califórnia, nos EUA, começou a multar estabelecimentos que entregam canudos plásticos – em casos recorrentes, existe até mesmo pena de prisão.

“Este movimento é crescente no Brasil. Rio de Janeiro, Fernando de Noronha e outras cidades litorâneas, principalmente, estão adotando políticas contra estes materiais. Sem dúvida, isso representa um impacto muito grande do não descarte inadequado dos resíduos plásticos nos oceanos”, complementa Lobo.

Veja também: Mergulho virtual alerta sobre o descarte de lixo plástico nos oceanos

O Rio de Janeiro foi o primeiro estado a se posicionar quanto ao assunto. A lei dos canudinhos – como ficou conhecida em todo o País – desencadeou uma série de projetos em outras regiões brasileiras, proibindo a distribuição dos canudos plásticos em estabelecimentos comerciais.

É importante ressaltar que o canudo não representa todo o universo de resíduos plásticos nos oceanos, no entanto, ele exerce um impacto muito grande na educação dos consumidores e dos próprios bares e restaurantes. “É um produto de vida única, que dura cerca de cinco minutos na mão da pessoa. O canudinho pode ser facilmente recusado e não tem uma importância vital para o consumo do líquido. Quando necessário – em casos de pessoas com deficiência física ou para tomar uma água diretamente do coco, por exemplo –, nós temos opções para substituir o plástico, como canudos de bambu, papel e metais”, diz Anna Lobo, do WWF-Brasil.

De fato, a lei dos canudinhos se propõe a fazer apenas uma coisa: banir o produto. Porém, é preciso fiscalizar os negócios e educar a sociedade para que o resultado seja eficaz. Apesar do pioneirismo, o Rio de Janeiro pecou na sua fiscalização e os canudos plásticos continuam sendo utilizados em diversos pontos comerciais da cidade.

Para Anna Lobo, frear a produção e distribuição deste e outros materiais plásticos de uso único são ações definitivas para este momento. Segundo ela, cerca de 95% dos plásticos quando chegam às mãos dos consumidores são descartados em seu primeiro e único uso. Além de banir a produção, a regulamentação do descarte inadequado também se faz necessária. Afinal, 80% do lixo que chega aos oceanos são gerados em terra, arrastados pelas chuvas aos córregos e rios e, por fim, acabam nos oceanos.

“Hoje em dia, 90% das aves têm sido encontradas mortas com lixo no estômago, além de animais marinhos como baleias e golfinhos. O próprio pescado que as pessoas comem já contêm microplásticos em seus estômagos. Então, estamos consumindo plásticos que nós mesmos produzimos. A estimativa de que até 2050 terão mais resíduos plásticos do que peixes nos oceanos é real”, ressalta.

Segundo informações da ONU, o mundo produz 300 milhões de toneladas de lixo plástico por ano. Somente 14% é coletado para o processo de reciclagem e, pior ainda, 9% do volume total é, de fato, reciclado. Entre os motivos estão a constatação de que nem todo plástico é reciclável e a falta de conscientização pública quanto à prática.

Em março, a Quênia sediará a 4ª sessão da UN Environment Assembly (UNEA-4) – Assembleia do Meio Ambiente da ONU –, onde será apresentada uma proposta para que países assumam o compromisso de banir a produção e comercialização de produtos plásticos de uso único. Para Lobo, é importante que o Brasil seja um dos signatários desta resolução. “Além disso, é preciso regular a questão do descarte dos resíduos plásticos nos oceanos no âmbito da Política Nacional de Resíduos Sólidos, algo que já está em discussão.”

Estabelecimentos comerciais

Copos e canudos de vidro ou de outros materiais são opções para substituir o plástico. Foto: Pixabay/Alexas_Fotos_3049099.

Empresas e estabelecimentos comerciais também desempenham um papel importante em toda esta discussão. Burger King, Starbucks e McDonald’s são algumas marcas internacionais que aderiram ao movimento. A Nestlé, por exemplo, está delineando planos para eliminar de maneira gradual o plástico de seus produtos. O plano geral é utilizar apenas materiais puramente recicláveis e reutilizáveis até 2025, segundo comunicado oficial.

A empresa espera, a partir deste mês de fevereiro, retirar os canudos plásticos de seus produtos, aproveitando materiais alternativos, como o papel. De acordo com o comunicado da Nestlé, nem mesmo o 100% de reciclabilidade do material não é capaz de resolver o problema da poluição plástico como um todo.

A AccorHotels também aderiu a campanha contra os canudos plásticos. Desde julho do ano passado, a rede mundial de empreendimentos hoteleiros incentiva o desuso dos canudinhos em seus estabelecimentos e restaurantes que operam dentro dos hotéis. Em 2017, o Grupo consumiu 54 milhões de canudos apenas na América do Sul. Até junho de 2018, o consumo tinha caído 20%.

“É uma iniciativa ousada e que impacta em uma mudança de costumes de todos. Para alavancar esta mudança comportamental, investimos esforços em compartilhar informações sobre o tema com nossos colaboradores e clientes, além de levar o tema para a sociedade em geral por meio de influenciadores digitais. A conscientização é importante para a aderência do movimento”, diz Antonietta Varlese, vice-presidente de Comunicação e Responsabilidade Social Corporativa da AccorHotels América do Sul.

Este cenário abriu portas para novas opções de produtos no mercado que buscam substituir o plástico. Apontados como soluções mais sustentáveis, as maiores apostas são os canudos de papel, bambu, vidro e, até mesmo, de macarrão. A estratégia da Accor visa, primeiramente, incentivar o desuso de canudos, assim, as bebidas são servidas sem o item e, apenas se solicitado pelo hóspede, o colaborar entrega um canudo de material alternativo.

“O canudo de inox é uma opção interessante, pois é lavável e pode ser utilizado mais de uma vez. A opção de bambu também é viável, pois provém de uma fonte renovável, que é o próprio bambu. Além de ser uma opção natural, é lavável e, portanto, reutilizável, o que compensa o custo mais alto quando comparado a outros. O de papel, entretanto, ainda é o mais utilizado em estabelecimentos comerciais, justamente pelo preço mais acessível. Ele também é uma boa escolha por ser muito resistente e biodegradável”, comenta Antonietta.

A discussão sobre os efeitos do descarte de lixo no mar é antiga, porém, segundo a executiva, o boom de notícias sobre a morte de animais marinhos em decorrência dos canudos plásticos causou uma grande comoção internacional.

“Os hóspedes estão mais conscientes da importância de modificar os hábitos no que diz respeito ao uso de canudos e outros itens plásticos. Envolve responsabilidade ambiental, preservação da fauna marinha e, por isso, diz respeito à vida. O estranhamento quanto ao uso de canudos de outros materiais ou mesmo a ausência deles tem diminuído”, finaliza.

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