Tratamento de águas cinzas ajuda a diminuir o consumo de água potável, contribuindo para a redução na conta de água e para a preservação do recurso.
Aproveitar bem os recursos naturais é um dos maiores desafios da sustentabilidade. Ao mesmo tempo, é fazendo uma boa gestão destes recursos que se torna possível alcançar melhores resultados. A água é o nosso maior bem natural e o mais usado durante o dia a dia – seja para fins industriais seja para o doméstico –, portanto, é preciso ter atenção redobrada para não correr riscos com desperdícios. O reúso de águas cinzas é uma ótima maneira de otimizar a sustentabilidade e, ainda, obter economia financeira direta.
Água cinza é toda água residual doméstica – ou seja, não industrial – proveniente de chuveiros, torneiras de banheiros e máquinas de lavar. “São efluentes líquidos gerados de edificações residenciais e comerciais que podem ser reutilizadas para fins não potáveis”, explica Virgínia Sodré, fundadora da Infinitytech, empresa de gestão ambiental e de recursos hídricos.
A especialista ressalta que há uma pequena diferença que deve ser notada. “O reúso não inclui a água originada de pias de cozinhas, uma vez que elas possuem muitas gorduras devido a sua utilização. Dessa forma, ela é chamada de água cinza escura”, diz. As águas de bacias sanitárias – águas negras – também não são apropriadas quando o assunto é águas cinza e não devem ser misturadas.
A composição da água cinza não possui tantos componentes prejudiciais ao meio ambiente, o que torna o tratamento um processo relativamente simples. O tratamento pode ser físico ou químico – dependendo da carga orgânica destes efluentes – e, até mesmo, biológico. A escolha mais adequada deve levar em consideração a finalidade do reúso.
“Ambos os processos funcionam bem. Depende das características destes recursos, já que existem pequenas diferenças na qualidade que são influenciáveis na hora de propor o melhor tratamento”, afirma Virgínia.
Ideal para condomínios residenciais
Sempre há a possibilidade do reúso de águas cinzas, no entanto, é preciso avaliar bem a demanda e realizar um balanço líquido para ter certeza de que a solução irá trazer retorno financeiro.
Segundo Virgínia, dificilmente residências possuem uma viabilidade econômica devido ao custo de operação e manutenção que são necessários nos equipamentos. Já edifícios residenciais e grandes condomínios – bem como hotéis, clubes, entre outros – possuem uma demanda muito ativa de uso de água não potável, o que faz do reúso uma solução eficaz e econômica.
“O empreendimento residencial gera muito mais demanda para o reúso de águas cinzas do que o comercial. Em alguns casos, é mais indicado fazer um sistema de reúso de águas negras para os edifícios de uso comercial, uma vez que a quantidade destes efluentes é maior”, diz a executiva da Infinitytech.
Expande Vila Mariana: soluções implantadas
O Expande Vila Mariana – empreendimento residencial da construtora Trisul S.A localizado em São Paulo (SP) – vem trabalhando em soluções e elementos sustentáveis desde a sua concepção.
O reúso de águas cinzas é uma das práticas que trarão resultados positivos para os futuros moradores. “A principal estratégia de sustentabilidade do Expande Vila Marina é o reúso das águas cinzas nas bacias sanitárias dos apartamentos”, afirma Robson Artélite dos Santos, gerente de obras responsável pela operação.
Segundo o responsável, a água proveniente de chuveiros e lavatórios de 50% dos apartamentos passará por tratamento e será destinada ao reúso, enquanto a água cinza dos outros 50% será descartada diretamente na rede de esgoto. O empreendimento possui o total de 128 apartamentos, portanto 64 unidades abastecem o sistema de águas cinzas.
“O volume de metade dos apartamentos já é suficiente. Toda vez que um morador acionar a bacia sanitária de seu banheiro, vai saber que aquela água é de reaproveitamento. Isso desenvolve um pensamento crítico interessante quanto à importância do uso consciente do maior bem natural que temos. Sem água não há vida”, diz Robson.
As tecnologias instaladas no Expande Vila Mariana ficam no subsolo do empreendimento. As águas cinza que serão destinadas para o reúso passam por um tratamento de ultrafiltração que, de acordo com Robson, nada mais é do que um filtro de 200 micra que tem a capacidade de reter partículas e sólidos suspensos. Nesta primeira etapa é possível produzir até 1.600 litros/hora de água. O próximo passo é a osmose reversa, que se trata de um filtro muito mais fino de 30 micra – o qual produz até 1.100 litros/hora de água tratada para reuso.
É nesta segunda etapa que o tratamento vai eliminar os nutrientes que não são vistos a olhos nus. Para entender a precisão do tratamento, cada micron – singular de micra – equivale à milésima parte de 1 milímetro, ou seja, 0,001 milímetro. Dessa forma, as partículas sólidas maiores que 30 micra serão retidas no segundo refinamento – para se ter uma noção, um grão de areia tem em média de 200 a 500 micra, o que o torna facilmente retido pelo filtro.
“Após a finalização da água tratada, ela recebe uma quantidade de cloro para conservação e é bombeada para uma caixa d’água superior, onde alimentará as bacias sanitárias dos apartamentos”, explica o gerente de obras do empreendimento da Trisul.
Com a implantação deste sistema, o Expande Vila Mariana prevê o tratamento de cerca de 7.920.000 litros de água cinza por ano. Geralmente, o consumo da bacia sanitária é de 6 litros por descarga. Levando em conta que cada um de quatro moradores de um apartamento dão, em média, seis descargas por dia, o consumo da bacia sanitária é de 144 litros por dia (36 litros por pessoa). Ao fazermos a conta por mês e por ano, são 4.320 litros/mês e 51.840 litros/ano por apartamento. No total, as 128 unidades do condomínio consomem 6.635.520 litros/ano de água apenas com o uso da bacia sanitária.
Dessa forma, a implantação do sistema proporcionará ao Expande Vila Mariana uma economia de quase 6.650.000 litros/ano (números arredondados) de água, graças ao tratamento e ao reúso de águas cinzas. De acordo com o custo médio de R$ 0,0204/litro (R$ 20,40/m³) da água fornecida pela Sabesp, a economia do empreendimento deve chegar aproximadamente em R$ 135.600,00/ano.
Além do abastecimento da bacia sanitária, o reúso de águas cinzas destinado para irrigação de áreas verdes e lavagens externas de chão e pisos são os mais comuns – o que pode aumentar a economia financeira do condomínio. É importante dizer que a lavagem de pisos internos não é recomendada mesmo com o tratamento da água. O reúso de águas cinzas também não deve ser destinado para uso potável, como beber e cozinhar ou lavar mãos e rosto.